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  • Foto do escritorHellica Miranda e Rafaela Maciel

Feminismo e equidade de gênero

Dois termos em alta nas discussões, "feminismo" e "equidade de gênero" nem sempre são compreendidos de verdade.



Com o avanço da luta feminista através do século, a mulher passou a conquistar mais direitos. Era comum que se falasse “igualdade entre os gêneros”, mas, com o surgimento da dupla jornada, tornou-se palpável que apenas a “igualdade” não seria o suficiente. Era necessário que se criassem oportunidades mais justas, levando em consideração as desigualdades e dificuldades entre as pessoas, por isso, agora o termo mais aceito é “equidade de gênero”.


A equidade de gênero é a busca por oportunidades iguais para todas as pessoas, levando em consideração sua condição física, cor, financeira, capacidade mental e gênero. Enquanto a igualdade acredita em algo igual para todos, a equidade leva em consideração diversos fatores, assumindo que as pessoas não são iguais e precisam de oportunidades diferentes.


Créditos de imagem: IDH

Como na imagem retirada do site IDH, pode-se notar que, na igualdade, todos receberam caixas exatamente iguais, mas a oportunidade só pôde ser aproveitada por uma pessoa. Já na segunda imagem, oportunidades diferentes são disponibilizadas, levando em consideração o fator físico de cada indivíduo.


Na vida, funcionaria da mesma forma. Um homem e uma mulher estão disputando uma vaga para um emprego, mas a mulher tem vários fatores: com quem deixar os filhos, tempo de locomoção ao serviço, dupla jornada. Já o homem precisa apenas se candidatar. Para essa mulher, a equidade funcionaria melhor: disponibilizar a ela a chance de entrevista e processo seletivo on-line, por exemplo, evitando que ela precise se deslocar ao local da entrevista. Ou, ainda, que recebesse algum auxílio para conciliar maternidade e trabalho, como a iniciativa já adotada por diversas empresas de oferecer creche interna para os filhos dos funcionários, ou transporte direto para as escolas e creches.



A equidade não funciona apenas para a questão de gênero, mas também para questões físicas e mentais. Uma pessoa autista que, hipoteticamente, é excelente em contas, mas, infelizmente, não consegue ficar em um escritório com pessoas desconhecidas o dia todo, disputa uma vaga com outro candidato que tem a mesma facilidade com contas e, por não ter o espectro autista, consegue frequentar normalmente o escritório. A igualdade prega que ambos devem ter a mesma oportunidade. A equidade vai dizer que, para esse candidato, a melhor saída seria que ele tivesse uma sala separada ou a oportunidade de trabalhar remotamente.


Isabely Santos, de 14 anos, comenta sobre a questão: “Eu descobri o que era equidade com a minha irmã explicando, ainda é meio confuso, mas eu entendi que equidade é dar chances pra todo mundo, entendendo suas dificuldades e diferenças”, a estudante explica que o termo é novo para ela, mas que é extremamente importante para o movimento feminista: “Minha irmã é bem feminista e eu também sou, estou aprendendo ainda. Mas eu sei que a mulher trabalha bem mais que o homem e tem mais dificuldades também, seria legal se pensasse nessas dificuldades dela, pra ficar mais fácil”.


Créditos de imagem: Robert Wood Johnson Foundation

O termo não é novidade apenas para Isabely, mas também para Suelen Quaresma, de 30 anos, que também disse não ter escutado o termo antes: “Eu sempre falo muito de igualdade, igualdade para o salário, igualdade entre os serviços de casa. Mas, agora que eu entendi um pouco de equidade, faz sentido. Meu marido só precisa pensar em como ir até o trabalho, eu já preciso pensar em quem vai ficar com as minhas filhas, que horas vou voltar, quem vai dar janta pra elas, tudo isso”.


A equidade é, inclusive, uma das principais pautas da luta feminista. Por isso, que tal conhecer um pouco mais sobre o feminismo em si?



Feminismo

História


Em 1792, Mary Wollstonecraft publicou o livro ‘A vindication of the rights of woman’ (“Reivindicação dos Direitos da Mulher”, em português), uma das primeiras defesas da igualdade social e política da mulher. No livro, a britânica responde aos pensadores que não acreditavam que as mulheres deveriam receber educação formal, não apenas doméstica.


Mary Wollstonecraft por John Opie.

O livro foi escrito no contexto da Revolução Francesa, mesma época em que ocorreu o episódio conhecido como Marcha das Mulheres sobre Versalhes, em 1789, quando mulheres francesas iniciaram um levante contra o governo e se dirigiram ao Palácio de Versalhes com suas reivindicações e protestos sobre a inflação, a escassez de alimentos e o aumento da violência. Os protestos foram atendidos, em partes, com a criação da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. No entanto, esse documento não incluía os direitos civis da mulher.


Dois anos depois, em 1791, Olympe de Gouges (nascida Marie Gouze), ativista política abolicionista e a favor dos direitos civis femininos, produziu a Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã, como resposta à declaração assinada pelo rei anteriormente. O documento foi o primeiro a citar igualdade jurídica e legal entre homens e mulheres. Obviamente, a Declaração foi rejeitada e permaneceu desconhecida por quase dois séculos.


Olympe de Gouges por Alexander Kucharsky.

Olympe, que já vinha há anos escrevendo sobre o direito ao divórcio e relações sexuais fora do casamento, foi presa e morta na guilhotina apenas dois anos após a produção de sua Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã, depois de escrever uma peça que pedia um plebiscito para escolher uma nova forma de governo.


Em 1865, mais um passo em direção à formação do feminismo era dado, dessa vez por um homem: o filósofo liberal John Stuart Mill realizou uma campanha no Parlamento Britânico em que defendia o sufrágio para mulheres. Mill era, numa época em que o machismo imperava ainda mais que hoje, um forte defensor de que a submissão da mulher se dava por uma questão cultural, afirmando não haver argumentos plausíveis que justificassem a sujeição do sexo feminino.


John Stuart Mill | Créditos de imagem: London Stereoscopic Company - Hulton Archive

Quatro anos depois de seu discurso ao Parlamento, John Stuart Mill publicou ‘A subjugação da mulher’, em que defendia a igualdade de direitos entre os sexos. Na obra, Mill ataca a tese de que as mulheres são naturalmente inferiores aos homens, e vai além: para ele, essa desigualdade torna-se um atraso para o desenvolvimento humano.


Vinte e oito anos depois da obra de John Stuart Mill, a mais de 18 mil quilômetros de distância do lar do autor, a Nova Zelândia se tornou o primeiro país a garantir o voto às mulheres. Por trás dessa conquista estava a ativista, economista e jornalista Kate Sheppard, que promoveu a ideia do sufrágio feminino através de petições, reuniões e eventos, que usava para fazer conexões políticas.


Kate e seu grupo, formado principalmente por membros da Woman's Christian Temperance Union, a WCTU (“União de Temperança Cristã Feminina”, em português), obviamente tiveram ferrenhos opositores, que argumentavam que “a política estava fora da 'esfera natural' das mulheres no lar e na família”. No entanto, quase 32 mil assinaturas foram apresentadas ao Parlamento, representando cerca de um quarto da população europeia feminina adulta da Nova Zelândia.


Kate Sheppard | Créditos de imagem: H. H Clifford

O projeto foi aprovado em 19 de setembro de 1893, seis anos depois da nomeação de Kate Sheppard para um cargo de liderança da União de Temperança Cristã Feminina, posição que usou para favorecer sua luta pela causa.


Ou se matam as mulheres ou se lhes dá o voto.

— Emmeline Pankhurst


A ativista britânica Emmeline Pankhurst, ao lado de outras mulheres, estabeleceu o Women’s Social and Political Union, o WSPU (em português, “Sindicato Social e Político das Mulheres” ou “União Social e Política das Mulheres”), uma organização que realizava ações em prol da conquista do direito ao voto para as mulheres. Em certo ponto, as ações do grupo passaram a ser marcadas por atos violentos, quebra de vidraças, ataques e incêndios criminosos, o que passou a acontecer sobretudo após a manifestação de junho de 1908, quando mais de 500 mil ativistas se juntaram, em Londres, em uma manifestação que exigia o sufrágio feminino, e foram respondidos com indiferença por parte do Parlamento.


Emmeline Pankhurst | Créditos de imagem: Records of the National Woman's Party

Em 1913, uma ativista chamada Emily Davidson morreu ao se jogar na frente do cavalo do rei em uma corrida, e uma greve de fome de sufragistas encarceradas foi estabelecida, sendo “contornada” pelas autoridades com alimentação forçada. Mas a morte de Davidson acabou por ser um marco e um pontapé no movimento.


Casada com um defensor do sufrágio feminino e da liberdade de expressão, Emmeline Pankhurst teve 5 filhos, sendo 3 mulheres, todas que acabaram por se envolver com o movimento em algum momento de suas vidas. Em 1905, sua filha mais velha, Christabel, foi presa por cuspir em um policial. As outras duas, Adela e Sylvia, foram presas no ano seguinte durante uma manifestação no Parlamento.


A própria Emmeline foi presa, em 1908, por tentar entrar no Parlamento para entregar uma resolução de manifestação ao Primeiro-Ministro. Essa foi a primeira de sete vezes em que a ativista foi presa antes de o sufrágio feminino ser aprovado.


Em seu julgamento de 1908, ela declarou, no tribunal: “Não estamos aqui porque somos infratoras da lei, estamos aqui porque queremos mudá-la”.


O grupo obteve, na Inglaterra, certo sucesso com a aprovação do Representation of the People Act (em tradução livre: “Ato de Representação do Povo”), de 1918, que estabeleceu o voto feminino no Reino Unido. Essa conquista, no entanto, deveu-se principalmente à Primeira Guerra Mundial, quando, com a partida dos homens para os campos de batalha, mulheres passaram a exercer atividades que costumavam ser exclusivas dos homens.


O movimento sufragista — que ocorreu também em outros países — foi o principal marco da Primeira Onda Feminista.


Falando mundialmente, entre 1890 e 1994, mulheres de grande parte dos Estados conquistaram o direito de votar e se candidatar a cargos públicos.


Os movimentos feministas do século XIX e início do século XX, portanto, buscavam exatamente maiores conquistas no âmbito político, uma vez que, desde a Grécia antiga, por exemplo, voto e cidadania estão intimamente conectados.


A conquista das sufragistas inglesas impulsionou e ajudou a conquista das sufragistas estadunidenses, que garantiram seu direito ao voto no início da década de 1920, mudando ligeiramente seu discurso sobre “feminismo” para um discurso sobre “democracia” — ainda que um faça questão do outro.





Os direitos políticos femininos foram conquistados com longas lutas históricas, por mulheres desbravadoras que lideraram as primeiras conquistas feministas e colocaram a mulher também nos centros de decisão.


Desde o início do movimento, mesmo que algumas ativistas radicais tenham pregado o contrário, o feminismo em si nunca demonstrou, exigiu ou discursou sobre a superioridade feminina em relação ao homem ou a necessidade de subjugação do sexo masculino. Logo, não é sequer razoável condicionar o feminismo a “oposto do machismo”. Da mesma forma que o “racismo reverso” não existe, o termo “femismo”, palavra cunhada para expressar o tal oposto do machismo, é apenas mais um que se utiliza na descrição de fenômenos inexistentes na sociedade.






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