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  • Foto do escritorHellica Miranda

O “Guia da Boa Esposa” e a masculinidade tóxica

Viral nas redes sociais em 2018, manual atribuído à revista Housekeeping Monthly seria guia para esposas perfeitas. Mas como a masculinidade tóxica envenena também os homens?



Com ilustrações que circulam pela internet há anos, uma lista com 18 ensinamentos para a esposa perfeita, com origem atribuída a uma publicação da revista Housekeeping Monthly em maio de 1955, que teriam sido publicados no Good Wife’s Guide (Guia da Boa Esposa, em tradução para o português), já foi considerada uma farsa por diversos especialistas, mas, ainda que sua verdadeira origem seja desconhecida, o guia foi, de fato, criado e veiculado, inclusive amplamente por Fax, sobretudo no final dos anos 1990, e mostra com clareza e riqueza de detalhes como o papel da mulher na sociedade já mudou, mas que ainda exige transformações.



  • Tenha o jantar sempre pronto. Planeje com antecedência. Esta é uma maneira de deixá-lo saber que se importa com ele e com suas necessidades.


  • A maioria dos homens está com fome quando chega em casa, e espera por uma boa refeição (especialmente se for seu prato favorito), faz parte da recepção calorosa.


  • Separe 15 minutos para descansar, assim você estará revigorada quando ele chegar. Retoque a maquiagem, ponha uma fita no cabelo e pareça animada.


  • Seja amável e interessante para ele. Seu dia foi chato e pode precisar que o anime, e é uma das suas funções fazer isso.


  • Coloque tudo em ordem. Dê uma volta pela parte principal da casa antes do seu marido chegar. Junte os livros escolares, brinquedos, papel, e em seguida, passe um pano sobre as mesas.


  • Durante os meses mais frios você deve preparar e acender uma fogueira para ele relaxar. Seu marido vai sentir que chegou a um lugar de descanso e refúgio. Afinal, providenciando seu conforto, você terá satisfação pessoal.


  • Dedique alguns minutos para lavar as mãos e os rostos das crianças (se eles forem pequenos), pentear os cabelos e, se necessário, trocar de roupa. As crianças são pequenos tesouros e ele gostaria de vê-los assim.


  • Minimize os ruídos. Quando ele chegar, desligue a máquina de lavar, secadora ou vácuo. Incentive as crianças a ficarem quietas.


  • Seja feliz em vê-lo. O receba com um sorriso caloroso, mostre sinceridade e desejo em agradá-lo. Ouça-o.


  • Você pode ter uma dúzia de coisas a dizer para ele, mas sua chegada não é o momento. Deixe-o falar primeiro, lembre-se, os temas de conversa dele são mais importantes que os seus.


  • Nunca reclame se ele chegar tarde, sair pra jantar ou outros locais de entretenimento sem você. Em vez disso, tente compreender o seu mundo de tensão e pressão dele, e a necessidade de estar em casa e relaxar.


  • Seu objetivo: certificar-se de que sua casa é um lugar de paz, ordem e tranquilidade, onde seu marido pode se renovar em corpo e espírito.


  • Não o cumprimente com queixas e problemas.


  • Não reclame se ele se atrasar para o jantar ou passar a noite fora. Veja isso como pequeno em comparação ao que ele pode ter passado durante o dia.


  • Deixe-o confortável. Faça com que ele se incline para trás numa cadeira agradável ou deitar-se no quarto. Dê uma bebida fria ou quente pronta para ele.


  • Arrume o travesseiro e se ofereça para tirar os sapatos dele. Fale em voz baixa, suave e agradável.


  • Não faça perguntas sobre suas ações ou que questionem sua integridade. Lembre-se, ele é o dono da casa e, como tal, irá sempre exercer sua vontade com imparcialidade e veracidade. Você não tem o direito de questioná-lo.


  • Uma boa esposa sabe o seu lugar.



Feminilidade Fascinante



O guia original, além de — como anteriormente mencionado — ter origem incerta, tem "dicas" muito semelhante às lições da estadunidense Helen Andelin em seu livro Fascinating Womanhood (Feminilidade Fascinante, em tradução livre para o português), em que afirmava: "Não é sempre possível ou sequer certo que um homem faça de sua esposa prioridade em sua vida. Isso acontece devido à natureza de sua vida. Sua principal responsabilidade é prover".


Helen Ardelin escreveu o livro como complemento ao curso de casamentos que dava na Califórnia, e vendeu mais de 300 mil cópias a partir de uma editora e gráfica montada em sua garagem com o marido. A inspiração para o curso e o livro veio de uma série de panfletos distribuídos na década de 1920, que levavam o mesmo nome. 


Até hoje o ideal de casamento perfeito difundido pelos conceitos de Ardelin é seguido, sobretudo depois que a primeira aula on-line da linha Fascinating Womanhood foi transmitida no começo dos anos 2000. E Ardelin foi além: escreveu, também, o guia The Fascinating Girl, destinado a determinar o comportamento "ideal" para mulheres solteiras. Depois de sua morte, em 2009, sua filha assumiu seu legado, lançando uma continuação de Fascinating Womanhood: Fascinating Womanhood for the Timeless Woman, em 2018, e atualizando os livros da mãe.


O livro original, disponível na Amazon para compra no Brasil, promete ensinar "como a mulher ideal desperta o mais profundo amor e ternura de um homem", além de 8 regras para um "relacionamento de sucesso".


Em 1978, a psicóloga Martha L. Rogers publicou um artigo intitulado Fascinating Womanhood as a Regression in the Emotional Maturation of Women (Fascinating Womanhood como uma Regressão na Maturidade Emocional das Mulheres), argumentando que seguir os mandamentos do livro pode ser extremamente prejudicial ao desenvolvimento feminino e que segui-los poderia ser uma maneira de sabotar a autorrealização.


"Esses tipos de guia costumam dar o padrão, e esse padrão, em teoria, traz a felicidade. Então você não vai ficar feliz enquanto não chegar àquele padrão. Mas não é uma coisa que você quer. Você só quer isso porque as pessoas mostram que é legal", diz a psicóloga Isabele Rangel. "Tudo que é um guia de como você deve se portar meio que vira uma regra e, se isso é uma regra que é aceita, pode gerar problemas".


Ela ressalta que alguns desses problemas podem variar de disforias até quadros depressivos.


A Boa Esposa


Créditos de imagem: Les Films du Kiosque (Divulgação)

Lançado em 2020, o filme francês ‘A Boa Esposa’ foi recebido de formas mistas por público e crítica.


Centrado na escola de bons costumes e governança doméstica dirigida por Paulette Van der Beck, o longa foca na “doutrinação” de jovens garotas para tornarem-se esposas e donas de casa perfeitas.


A educação é centrada em 7 pilares, que são logo apresentados pela diretora:


Créditos de imagem: De Mulher Para o Mundo (com citações de ‘A Boa Esposa’).

A premissa do longa se afasta durante seu desenvolvimento, enquanto Paulette se encaminha na direção do autoconhecimento — e da autoconfiança — quando em contato com o feminismo ascendente da época.


Não quero mais fazer as meninas acreditarem que serão felizes sendo escravas dos homens.

— Paulette Van der Beck, de 'A Boa Esposa'.


Em uma revolução com suas alunas, Paulette marcha com seus 7 novos pilares:


Créditos de imagem: De Mulher Para o Mundo (com citações de ‘A Boa Esposa’).

Masculinidade tóxica: veneno universal



A Associação Norte Americana de Psicologia estima que 80% dos homens nos Estados Unidos sofrem de uma condição chamada "Alexitimia", que se caracteriza pela dificuldade em identificar e expressar os próprios sentimentos.


Mas, para o Homem da Vez, o internacionalista Leonardo Florêncio, esse silenciamento pode ser compulsório: "Diversas vezes eu senti isso. Principalmente quando são sentimentos negativos (tristeza, dor, medo, insegurança). Já as positivas são mais fáceis de demonstrar, mas, ainda assim, de forma bem contida".


Para ele, essa questão tem tudo a ver com gênero, pois sempre foi criado para "engolir o choro", "ser macho", "não reclamar" e ter que "demonstrar um mínimo de estabilidade e força" para "proteger a família".


"Os sentimentos negativos são difíceis tanto por conta da criação, quanto também por conta da atenção que recebemos. Muitas vezes, quando resolvo me abrir, meu problema é diminuído ou simplesmente ignorado, pois aparentemente ‘eu vou conseguir me virar’. Os positivos são mais tranquilos, mas sempre tem alguém pra reclamar, então fico na minha", declara. "Isso me atrapalhou muito durante o fundamental e o ensino médio. Hoje em dia sinto que melhorei muito nesse ponto e me sinto mais livre pra me expressar, mas ainda existe um resíduo dessas ideias pelas quais fui criado que ainda me travam de vez em quando".



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