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  • Foto do escritorValquíria Velasco

Por uma família: direitos suspensos e a onda conservadora na sociedade italiana — e brasileira

Como a política nacional e internacional interfere diretamente na formação e estabilidade legal de famílias


Créditos de imagem: Alma Afetiva

A definição do verbete Família pelo dicionário Michaelis nos diz que "família" é: "1 - Conjunto de pessoas, em geral ligadas por laços de parentesco, que vivem sob o mesmo teto. 2 - Conjunto de ascendentes, descendentes, colaterais e afins de uma linhagem ou provenientes de um mesmo tronco; estirpe. 3 - Pessoas do mesmo sangue ou não, ligadas entre si por casamento, filiação ou mesmo adoção; parentes, parentela".


No entanto, o direito à família tem sido um problema, em particular para pessoas homoafetivas em todo o mundo. No mês de julho de 2023, chegaram até nós, no Brasil, as notícias sobre a retirada dos direitos de pais e mães homossexuais na Itália. Casais que conseguiram por medidas judiciais o direito de registrar seus filhos, constituindo assim uma família genuína diante da lei.


O fato da política na Itália estar passando por uma onda conservadora atingiu seu ápice na aprovação eleitoral de Giorgia Meloni para o cargo de Primeira-Ministra. Giorgia é a primeira mulher a ocupar este cargo. No entanto, diferente do que poderíamos pensar deste fato, a escolha de uma mulher para o alto cargo ministerial em um país como a Itália não reflete um avanço das pautas feministas, pelo contrário. A jornalista Giorgia Meloni reúne em seu currículo político uma vida dedicada às pautas de extrema direita. Desde o início de sua carreira, a Primeira-Ministra está alinhada aos partidos com ideais neonazistas e suas ações frente ao partido Fratelli d’Italia têm refletido esses ideais.


Das pautas conservadoras defendidas por Giorgia, estão a criminalização do aborto e a proibição do casamento gay. A Ministra segue com muitos posicionamentos homofóbicos e outras posições conservadoras como ser contrária à eutanásia e a favor da revisão de diversas medidas e acordos com a União Europeia, além de ser favorável ao aumento da natalidade em seu país.


A Itália tem um histórico conservador, com uma parcela significativa de sua população católica e uma história que não nos deixa esquecer de seu antigo líder, Mussolini. Sendo este líder, a grande inspiração da atual Primeira-Ministra.


Diante deste cenário, os direitos para casais homossexuais e suas famílias encaram um grande perigo. Direito recém-adquirido, a união estável, conquistado apenas em 2016, não garantia a adoção ou medidas médicas para reprodução, fosse fertilização ou barriga de aluguel, com multas milionárias aos casais que descumprissem a lei. Segundo a lei de 2004, casais homoafetivos deveriam sair da Itália para os procedimentos, registrar seus filhos fora e a partir disso traduzir suas certidões para entrada no país.


Em 2021, no entanto, um tribunal em Milão deu parecer favorável ao registro de uma criança gerada em barriga de aluguel. A partir deste primeiro parecer, abriu-se um precedente e muitas famílias homoafetivas conseguiram também realizar o registro de seus filhos. No entanto, medidas judiciais podem ser mudadas mediante legislação ou ordem administrativa, como ocorre agora para esses casos.


O prefeito de Milão, Giuseppe Sala, atribuiu a intervenção à ausência de leis claras que garantiriam direitos igualitários para famílias homoafetivas.


Toda essa conjuntura de conservadorismo na Itália nos alerta para os direitos das famílias homossexuais no Brasil. Por aqui, também, as medidas sobre parentalidade de casais homoafetivos partem, ainda, de decisões judiciais. Adoções, inseminações ou barrigas de aluguel são formas que casais homossexuais encontram de realizar os seus sonhos de gerar filhos. No entanto, por não serem oficialmente garantidos por leis, essas medidas podem ser revogadas, tal como tem sido feito na Itália, o que traz mais insegurança aos casais.


Agora, em setembro de 2023, uma tentativa efetiva de retirada dos direitos de casais homoafetivos no Brasil. A PL 5167/09, apesar de declaradamente inconstitucional, segue em trânsito na Câmara dos Deputados em Brasília. A entrada desta pauta nos faz lembrar que, apesar da derrota conservadora na Presidência da República, ainda temos que lidar com o conservadorismo entre os cargos do Legislativo.


O Brasil, tal como a Itália, tem um histórico conservador e uma eterna luta entre avanços e retrocessos para pautas liberais.


Por aqui, também encaramos questões de ordem econômica quando observarmos a garantia do direito ao registro de filhos gerados em uma união homoafetiva. Entre mulheres, por exemplo, onde opções como fertilização in vitro chegam a custar mais de 30 mil reais, a opção mais barata parece ser a inseminação caseira, medida artesanal de inseminação, onde uma das mulheres recebe o sémen do doador através de uma seringa. O método que, apesar de desaconselhado por médicos, acaba por ser o mais popular entre mulheres sem condições financeiras para arcar com o procedimento em uma clínica de fertilização. Nestes casos, há a necessidade de entrar com um pedido judicial ainda durante a gravidez para garantir o registro das duas mães na certidão. Enquanto, para aquelas que fazem a FIV, o registro é facilitado por uma certificação dada pelas clínicas.



Ou seja, na Itália e no Brasil ainda temos um longo caminho para conquistar o direito de gerar e criar filhos em uma família homoafetiva. Homens gays e mulheres lésbicas que desejam ter seus filhos, precisam lutar por direitos garantidos em leis, para que não haja possibilidade de verem suas conquistas sendo retiradas ao bel-prazer de governantes conservadores.

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